sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Sexta-feira

[DIA DE VÉNUS]

© na Net (?)


«de todo
voltavam desta grande festa apaixonados por ela.»

«Desde as montanhas escarpadas e cobertas de pinheiros até à planície.»
[THOREAU, 2018: 373]

«A mais familiar extensão de água, quando vista do cimo de outra colina, assume um novo e inesperado encanto. Ao fim de termos percorrido alguns quilómetros, deixamos de reconhecer os próprios contornos dos montes sobranceiros à nossa aldeia natal, e porventura nenhum homem conhece bem o horizonte observado da colina que se encontra mais perto da sua casa e é capaz de recordar com nitidez o seu contorno quando se encontra no vale. Em geral, a uma distância um pouco maior, já não sabemos de que lado estão as colinas que rodeiam as nossas casas e quintas. É como se o nosso nascimento tivesse fendido as coisas e tivéssemos sido inseridos na natureza como uma cunha, e enquanto a ferida não sarar e a cicatriz não desaparecer não começaremos a descobrir onde estamos e que a natureza é una e contínua em todo o lado. É um momento importante quando um homem que sempre viveu na vertente leste de uma montanha, e a viu a oeste, dá a volta e a vê de leste. O universo é uma esfera cujo centro está onde está a inteligência. O Sol não é tão central como o homem. No cume de uma colina isolada, em campo aberto, parece que estamos na bossa de um imenso escudo, com a paisagem mais próxima como que num plano inferior relativamente à mais distante, subindo gradualmente em direcção ao horizonte, que é a borda do escudo – mansões, campanários, florestas, montanhas, uns acima dos outros, até serem engolidos no céu. As montanhas mais distantes no horizonte parecem erguer-se directamente da margem desse lago nos bosques, junto ao qual nos encontramos casualmente, enquanto do cume da montanha não se distingue este nem um milhar de outros mais próximos e maiores.
Observados através desta atmosfera límpida, os trabalhos do agricultor, a lavra e a ceifa, tinham uma beleza aos nossos olhos que ele nunca viu. Que afortunadamente somos nós por não possuirmos um acre destas margens, mas que não renunciámos ao nosso título de propriedade sobre tudo. Quem souber apropriar-se do verdadeiro valor deste mundo será o mais pobre dos homens. Pobre rico! Tudo o que tem é tudo o que comprou. Eu, o que vejo é meu.»
[THOREAU, 2018: 386-387]


© na Net (?)

«Quando me lembro da história dessa luz ténue no nosso firmamento a que chamamos Vénus, que os antigos observavam e para onde os homens modernos ainda olham, uma chispa brilhante ligada a uma esfera oca que gira em torno da Terra, que descobrimos ser, em si, outro mundo – e de como Copérnico previu, após reflectir longa e pacientemente sobre o assunto, ainda antes de o telescópio ter sido inventado, que se algum dia o homem a viesse a ver com mais nitidez descobriria que ela tem fases como a nossa Lua, e de que menos de um século após a sua morte o telescópio seria inventado, tendo essa predição sido confirmada por Galileu – tenho, esperança de que possamos, aqui e agora, obter informação mais precisa acerca desse outro mundo cuja existência o instinto da humanidade previu durante tanto tempo. Na realidade, tudo o que chamamos ciência, bem como tudo o que chamamos poesia, é uma partícula dessa informação, rigorosa até certo ponto, mesmo sem chegar ao âmago da verdade. Se conseguimos raciocinar com tanto rigor, e assistir à maravilhosa confirmação do nosso raciocínio, no que respeita aos chamados objectos materiais e aos acontecimentos muito para além do alcance da nossa visão natural, de tal modo que a mente hesita em confiar nos seus cálculos mesmo quando estes são confirmados pela observação, porque não hão-de as nossas especulações penetrar igualmente fundo no sistema estelar imaterial do qual o outro [a exemplo de Vénus] é apenas o aspecto exterior e visível? Não há dúvida de que somos dotados de sentidos tão aptos a sondar os espaços do real, do substancial e do eterno, como sondar o universo material. Veias, Manu, Zoroastro, Sócrates, Cristo, Shakespeare, Swedenborg – eis alguns dos nossos astrónomos.»
[THOREAU, 2018: 386-387]


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
THOREAU, Henry David. Uma Semana nos Rios Concord e Merrimack. Lisboa: Antígona, 2018, pp. 432. ISBN 978-972-608-300-9


Sem comentários:

Enviar um comentário