Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de
sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.
Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar
por isso.
Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que
chove mais.
Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.
E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a
encosta
A ser muita coisa feliz ao mesmo
tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao
pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por
cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.
Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou
pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no
meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo
as minhas ideias,
Ou olhando para as minhas ideias e
vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não
compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.
(...)
Alberto Caeiro
O Guardador de Rebanhos
Serra de Candeeiros © António Pimpão (2013)
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