quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Festejar a Montanha


Pedro Cuiça © Biblioteca de Montanha  (Queijas, 2018)

Nestes dias em que se “(sobre)vive” (a) um afã híper-consumista, ademais nesta que é designada a “época natalícia” (!), será pertinente salientar a importância de apoiar os mercados livreiros de nicho, mormente aquele que se dedica à montanha: editoras, livrarias, alfarrabistas e autores, entre outros – como agora se costuma dizer – stakeholders! O assunto num país como Portugal fará pouco ou nenhum sentido, tendo em conta que a realidade editorial de montanha é praticamente inexistente e o pouco que existe ou existiu é como se não existisse ou tivesse existido!... Particularidades e/ou minudências, para muitos, de somenos num país à beira-mar plantado e historicamente ancorado a uma gesta marítima que talvez não se coadune com ambientes de montanha. No entanto, e tendo em conta a globalização do consumo, designadamente com a possibilidade de comprar on-line produtos provenientes das mais diversas partes desta aldeia global que é a Terra, se pretende ofertar algo, a um familiar, amigo ou mesmo a si próprio, aposte na literacia de montanha e não hesite em apoiar os micro, “piquenos” e médios projectos editoriais que continuam a medrar em diversas línguas por esse mundo fora, nomeadamente no “ arco alpino” (com destaque para o francês, alemão e italiano), mas não só (também em inglês, espanhol e, pasme-se, português). É nesse contexto, que aproveitamos para destacar um pequeno texto, sobre a temática da literatura de montanha, publicado no número de Dezembro da revista Montagne360. E, claro, é igualmente neste contexto que desejamos Boas Festas a todos os leitores do Pedestris, se possível de ar livre ou, caso contrário, numa boa viagem de sofá...

Pedro Cuiça © Editorial Desnivel (Madrid, 16/12/2018)

IL COLLEZIONISTA
A cura di Leonardo Bizzaro e Riccardo Decarli, Biblioteca della Montagna

Le collane – almeno da quando l’alpinismo è diventato uno sport di massa, o quasi – hanno forse avvicinato alla pratica della montagna più persone di quanto abbiano fatto le scuole del Cai. Lo han ben intuito Pietro Crivellaro, che proprio alle “Cordate di libri” ha dedicato una bella mostra per la decima Rassegna internazionale dell’editoria di montagna, nel 1996 al Filmfestival di Trento, presentandone venti delle più importante, da La piccozza e la penna di Adolfo Balliano, nata nel 1929, alla relativamente recente I Licheni di Vivalda. Tra le più note, eppure sconosciute dal punto di vista bibliografico, c’è Montagne di Zanichelli, che per i primi suoi titoli è stata curata nientemeno che da Walter Bonatti. Non solo, ché a disegnarne la grafica, e la veste editoriale, è stato un genio come Albe Steiner, il più bravo trai i grafici attivi nel mondo librario nostrano. Debuttò nel 1961 la collana, con Le mie montagne (dodici ristampe fino al 1981 e altre tre in economica), che Bonatti scrisse senza esserne ancora il titolare. Dell’importanza di quel libro, il più appassionante del suo autore, non occorre qui aggiungere altro. Vale però la pena ricordare gli altri che lui volle collana, senz’altro con lo zampino degli Enriques, proprietari della casa editrice dal 1946 e grandi patiti della montagna. Eccoli: Il Gran Cervino curato da Alfonso Bernardi, del 1963 ; Il quattordici ‘8000’ a cura di Mario Fantin, del 1964; i due volumi di Il Monte Bianco, del 1965 e 1966, a firma ancora di Bernardi (pure in elegante cofanetto telato e decorato, e anche in volume unico): tranne Bonatti, la cui prima edizione sfiora spesso i 200 euro, gli altri si trovano di solito a cifre ragionevoli, um po’più caro solo il Monte Bianco. Poi, al tempo dell’addio alla pratica della montagna, il più mediato dei nostri alpinisti abandono anche quest’attività, passata prima ad Alfonso Bernardi, poi all’ottimo Luciano Marisaldi.
[in Montagne360, Dez. 2018: 77]

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Montagne360 – La rivista del Club alpino italiano, Dezembro, 2018, pp. 80. ISSN 2280-7764



terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Encuentro de Montañeros


Pedro Cuiça © Madrid (15/12/2018)


A Federação Espanhola de Desportos de Montanha e Escalada (FEDME) realizou, na noite de 15 de Dezembro, a sua gala anual – Encuentro de Montañeros – no Novotel Madrid Campo de las Naciones. Uma oportunidade única para constatar in loco a diversidade de áreas desportivas e temáticas, tal como os elevadíssimos níveis de desempenho desportivo, desenvolvidos no âmbito dessa federação, num país que é indubitavelmente uma das maiores potências dos desportos de montanha a nível mundial. Essa foi também uma ocasião ímpar para conhecer alguns dos atletas de topo nas áreas da escalada, corridas de montanha e alpinismo, bem como para rever muitos e bons companheiros.

O Sentimento da Montanha


Rui Calado © Biblioteca Municipal de Lagoa (14/12/2018)

«O montanhismo (…), para além da componente física, será também uma profunda experiência emocional, uma atracção pela liberdade dos vastos espaços verticais, pela grandiosa beleza do mundo mineral, pela simplicidade e rusticidade. Subir montanhas será igualmente um meio de (re)ligação à natureza, uma forma de transcendência… (…) “Um fraco desejo de regressar lá ao alto surge um dia em nós. Assim recomeça o encantamento.”»
Pedro Cuiça (2010: 27)

A tertúlia sobre O Sentimento da Montanha: do imanente ao transcendente, que decorreu no final do dia 14 de Dezembro na Biblioteca Municipal de Lagoa (Algarve), resultou de uma proposta (melhor seria dizer “desafio”), por parte da Dra. Maria Luísa Francisco, para abordarmos a vertente “espiritual” do montanhismo. Um desafio certamente, tendo em conta essa forma pouco “usual” de aproximação a ambas as temáticas, fenómeno que aliás já tínhamos tido a oportunidade de constatar aquando da apresentação de semelhante “matéria” (!) na Casa do Fauno.
A abordagem em causa iniciou-se através de um enquadramento filosófico efectuado numa perspectiva assumidamente ocidental, tendo em conta que o montanhismo teve origem nos Alpes e os seus paradigmas foram exportados para o resto do mundo, com claras influências na sua praxis até aos dias de hoje. O Oriente não tem, de todo, o exclusivo da “espiritualidade” e, nessa matéria, foi explanada uma perspectiva do montanhismo consentânea com a riqueza “espiritual” do extremo Ocidente que é esta Finisterra ibérica ainda hoje conhecida por Lusitânia, mormente à luz daquilo que é costume designar por “filosofia portuguesa”. Da Montanha perfeita ao foco no cume enquanto ara dea, do sacro ofício de ascender montanhas às razões que animam essa actividade do profano (vale) ao sagrado (montanha) até ao “porquê?” e ao “para quê?” subir montanhas. Uma via que nos conduziu ao “como?” fazer essas prática com base em três conceitos-chave: imaginação, jogo e totalidade. Por fim, a/o Montanha(ismo) enquanto metáfora: o Monte Abiegno, a anábase celeste e a transformação da experiência da Montanha num modo de ser ao estilo de Julius Evola.

«(…) la verdadera realización, la superación del elemento instintivo e irracional, la plena y firme autoconsciencia, es decir, la transformación de la experiencia de la montaña en un modo de ser. Es entonces cuando surge (…) el sentido de que todo o marchar, todo ascender, todo conquistar, todo osar, es el único medio contingente de expresión de una realidad inmaterial, lo cual podría tener muchos otros medios: y esto sería la fuerza de aquellos que, en el fondo, pueden decir a sí mismos que nunca regresamos desde las cumbres hasta la llanura, de aquellos a quienes no les importa ni el ir ni el volver, porque la montaña está en su espíritu, porque el símbolo se ha convertido en realidad (…).»
Julius Evola in Meditaciones de las Cumbres (1974)

Rui Calado © Biblioteca Municipal de Lagoa (14/12/2018)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CUIÇA, Pedro. Guia de Montanha – Manual Técnico de Montanhismo I. Lisboa: Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal/Campo Base, 2010. ISBN 978-989-96647-1-5


Pensar (como um)a Montanha



«Uma boa definição de homem, para além de suas limitações físicas, seria a de que é um ser de embrionária liberdade, cujo dever, cujo destino e cuja justificação é o da liberdade plena; plena para ele, plena para os outros, plena para os animais, plenas para as ervas, plena talvez até para seixo e montanha
Agostinho da Silva (1999: 262-263 in MARTINS, 2016: 112)

Um enquadramento filosófico sobre algumas evoluções marcantes no pensamento humano, no âmbito da estética e da ética, que se traduziram, em três séculos, numa mudança radical de paradigma: da alta montanha horrível à beleza das montanhas. Das paisagens montanhosas, em segundo plano, dos quadros de Leonardo da Vinci, passando pelas montanhas sagradas de Nicholas Konstantinovich Roerich, às abordagens holísticas da paisagem de Jan C. Smuts. Das éticas antropocêntricas às correntes de pensamento e às éticas ambientais com notórias influências na origem do montanhismo: os pré-romantismo e o romantismo, o transcendentalismo de Concord, a preservação da natureza de John Muir, a ética da Terra de Aldo Leopold e a ecologia profunda de Arne Naess. Do alpinismo/montanhismo enquanto actividade de ascender/escalar montanhas aos multifacetados desportos de montanha…
Um caminho percorrido para chegar à questão: qual a feição do sentir/pensar (como um)a montanha nos dias de hoje? Uma reflexão não só pertinente como fundamental face às alterações climáticas com que temos de nos confrontar. A guerra-pacifista actual passará inevitavelmente pela preservação das montanhas e esse é o grande desafio lançado pela Organização das Nações Unidas no Dia Internacional das Montanhas 2018 sob o mote “As montanhas são essenciais para as nossas vidas”.


«Um uivo vindo das profundezas ecoa de orla em orla rochosa, rola montanha abaixo e extingue-se na longínqua escuridão da noite. É a erupção de uma dor selvagem e desafiadora, cheia de desdém por todas as adversidades do mundo. (…) por trás dessas óbvias esperanças e medos reside um significado mais profundo que só a montanha conhece. Só a montanha viveu o bastante para escutar objectivamente o uivo do lobo
Aldo LEOPOLD (2008: 128)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
LEOPOLD, Aldo. Pensar como uma Montanha. Águas Santas: Edições Sempre-em-Pé, 2008. ISBN 978-972-8870-10-2
MARTINS, Pedro. A Liberdade Guiando o Povo. Sintra: Zéfiro, 2016, pp. 190. ISBN 978-989-677-138-6


quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Montanhas em si


DR © Nikolai Konstantinovich Roerich (Kanchendzonga, 1944)


«Chama-se honroso a tudo o que parece difícil; o que é indispensável e difícil ao mesmo tempo, chama-se bem; e o supremo recurso no perigo mais extremo, o que há de mais raro e de mais difícil, chama-se sagrado.»
[NIETZSCHE, 1985: 65]

É acumulando montanhas que o discípulo do conhecimento deve aprender a construir. Transportar montanhas é para o espírito pouca coisa: já o sabíeis?
[NIETZSCHE, 1985: 115]


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
NIETZSCHE, Friedrich. Assim Falava Zaratustra. Lisboa-. Guimarães Editores, 1985, pp. 376.

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Montanhas da/na mente



Na próxima semana, no âmbito da comemoração do Dia Internacional das Montanhas, vamos abordar, na sede da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal (Lisboa) e na Biblioteca Municipal de Lagoa (Lagoa  Algarve), um conjunto de temáticas em torno do pensar/sentir a montanha. Nesse contexto, deixamos aqui uma citação extraída do livro Mountains of the Mind – A History of a Fascination, de Robert MacFarlane (Granta Books, 2003), que constitui uma das inspiradoras referências bibliográficas a que iremos recorrer.

© da/na Net

As late as 1791 William Gilpin noted that ‘the generality of people’ found wilderness dislikeable. ‘There are few’, he continued, ‘who do not prefer the busy scenes of cultivation to the greatest of nature’s rough productions.’ Mountains nature’s roughest productions, were not only agriculturally intractable, they were also aesthetically repellent : it was felt that their irregular and gargantuan outlines upset the natural spirit-level of the mind. The politer inhabitants of the seventeenth century referred to mountains disapprovingly as ‘deserts’ ; they were also castigated as ‘boils’ on the earth’s complexion, ‘warts’, ‘wens’, ‘excrescences’ and even, with their labial ridges and vaginal valleys, ‘Nature’s pudenda’.
Moreover, mountains were dangerous places to be. It was believed that avalanches could be triggered by stimuli as light as a cough, the foot of a beetle, or the brush of a bird’s wing as it swooped low across a loaded snow-slope. You might fall between the blue jaws of a crevasse, to be regurgitated years later by the glacier, pulped and rigid. Or you might encounter a god, demi-god or monster angry at having their territory trespassed upon – for mountains were conventionally the habitat of the supernatural and the hostile. In his famous Travels, John Manderville described the tribe of Assassins who lived high among the peaks of the Elbruz range, presided over by the mysterious ‘Old Man of the Mountain’. In Thomas’s More’s Utopia the Zapoletes – a ‘hideous, savage and fierce’ race – are reputed to dwell ‘in the high mountains’. True, mountains had in the past provided refuge for beleaguered peoples – it was to the mountains that Lot and his daughters fled when they were driven out of Zoar, for instance – but for the most part they were a form of landscape to be avoided. Go around mountains by all means, it was thought, along their flanks or between them if absolutely necessary – as many merchants, soldiers, pilgrims and missionaries had to – but certainly not up them.
During the second half of the 1700, however, people started for the first time to travel to mountains out of a spirit other than necessity, and a coherent sense began to develop of the splendour of moutainous landscape. The summit of Mont Blanc was reached in 1786, and mountaineering proper came into existence in the middle of the 1800s, induced by a commitment to science (in the sport’s adolescence, no respectable mountaineer would scale a peak without at the very least boiling a thermometer on the summit) but very definitely born of beauty. The complex aesthetics of ice, sunlight, rock, height, angles and air – what John Ruskin called the ‘endless perspicuity of space ; the unfatigued veracity of eternal light’ – were to the later nineteenth-century mind unquestionably marvellous. Mountains began to exert a considerable and often fatal power of attraction on the human mind. ‘The effect of this strange Matterhorn upon the imagination is indeed so great,’ Ruskin could claim proudly of his favourite mountain in 1862, ‘that even the gravest philosophers cannot resist it’. Three years later the Matterhorn was climbed for the first time ; four of the successful summitteers fell to their deaths during the descent.
(…) Today the emotions and attitudes which impelled the early mountaineers still proper in the Western imagination : indeed if anything they are more unshiftably ensconced there. Mountain-worship is a given to million of people. The vertical, the ferocious, the icy – all these are now automatically venerated forms of landscape, images of wich permeate an urbanized Western culture increasingly hungry for even second-hand experiences of wildness and wilderness. Mountain-going has been one of the fastest growing leisure activities of the past twenty years. An estimated 10 million Americans go mountaineering annually, and 50 million go hiking. Some 4 million people in Britain consider themselves to be hill-walkers of one stripe or another.
(…) Over the course of three centuries, therefore, a tremendous revolution of perception occurred in the West concerning mountains. (…) So drastic was this revolution that to contemplate it now is to be reminded of a truth about landscapes ; that our responses to them are for the most part culturally devised. That is to say, when we look at a landscape, we do not see what is there, but largely what we think is there. We attribute qualities to a landscape which it does not intrinsically posses – savageness, for example, or bleakness – and we value it accordingly. We read landscapes, in other words, we interpret their forms in the light of our own experience and memory, and that of our shared cultural memory.
(…) What we call a mountain is thus in fact a collaboration of the physical forms of the world with the imagination of humans – a mountain of the mind.
[MACFARLANE, 2003 : 14-19]


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
MACFARLANE, Robert. Mountains of the Mind – A History of a Fascination. Londres : Granta Books, 2003, pp. 310. ISBN




quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Mountaincraft


Fundamentally, a leader must have ability. Ability has two components: knowledge and skill. Knowledge is understanding a task. Skill is proficiency at performing a task. The key to developing knowledge and skill is repeated exposure. (…) In order to generalize learning to a variety of complex situations, you as a leader need to have a varied and extensive base of exposure to related situations. It is this experience that allows you to develop ability.
In Mountaincraft and Leadership, the official handbook of the Mountain Leader Training Boards of the United Kingdom, author Eric Langmuir is quite clear regarding the first order of business for aspiring leaders: “The chances of becoming an effective party leader are greatly reduced unless a considerable amount of time is spent on acquiring experience.” His is an honest and accurate statement.
[KOSSEFF, 2003: 37]

DR ©


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
KOSSEFF, Alex. AMC Guide to Outdoor Leadership. Appalachian Mountain Club Books, 2003, pp. 282. ISBN 1-929173-21-0

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Mountain Skills

DR ©

A UIAA – a Federação Internacional de Montanhismo e Escalada – está empenhada na formação e no treino em Desportos de Montanha, com vista designadamente ao incremento de conhecimentos técnicos, à melhoria de competências/desempenho e à redução do risco inerente à sua prática. É nesse contexto que a Comissão de Montanhismo, da qual tenho o grato prazer de ser membro efectivo, tem vindo a desenvolver um conjunto de iniciativas formativas de que destacamos a publicação, em 2015, de UIAA Alpine Skills Summer. Este manual, produzido sob os auspícios da Fundação Petzl, tem vindo a ter uma grande aceitação a nível global, está traduzido em cinco idiomas e é passível de ser adquirido em versão digital ou em papel. Para marcar o lançamento da versão digital deste importante manual técnico, a UIAA disponibiliza agora, on-line e gratuitamente, uma série de artigos com informações úteis com enfoque nos skills.



terça-feira, 27 de novembro de 2018

Errar é bom


Por tentativa e erro...

«Primeiro estranha-se, depois entranha-se.»
Fernando Pessoa (1929)

DR © algures (Serra da Estrela, 24/11/2018)

O treino intensivo assenta num paradoxo: no esforço por determinados objectivos – permitindo-nos cometer erros e, ao parecermos estúpidos, tornarmo-nos inteligentes. Ou seja, experiências em que somos obrigados a abrandar o ritmo, a fazer erros e a corrigi-los – é como se estivéssemos a escalar uma encosta coberta de gelo, escorregando e tropeçando à medida que avançamos – acabando por nos tornar mais ligeiros e graciosos sem que disso nos apercebamos.
«Temos tendência a pretender um desempenho sem esforço mas, de facto, é uma péssima forma de aprendizagem», afirma Robert Bjork*, (…) o director de psicologia da UCLA, [que] passou a maior parte da vida a fazer investigação sobre questões da memória e aprendizagem.
(…) «Coisas que parecem obstáculos tornam-se desejáveis a longo prazo» diz Bjork. «Um verdadeiro confronto, ainda que de escassos segundos, é de longe mais útil do que centenas de observações.»
(…) «Temos tendência para considerar a nossa memória como um gravador, mas não é verdade», diz ele. «É uma estrutura viva, uma armação de proporção quase infinita. Quanto mais impulsos gerarmos, enfrentando e ultrapassando as dificuldades, mais armações construímos. Quanto mais armações construímos, mais rapidamente aprendemos.»
Quando treinamos intensamente, as regras normais do mundo são suspensas. Usamos o tempo de forma mais eficiente. Os nossos pequenos esforços produzem resultados maiores e mais duradouros. Conseguimos multiplicar as nossas forças e transformar o fracasso em perícia. O truque consiste em escolher um objectivo um pouco além das nossas capacidades para dirigir o esforço. Insistir às cegas não ajuda. Alcançar sim.
«Trata-se apenas de encontrar o ponto-chave», diz Bjork. «Existe um intervalo optimizado entre aquilo que se conhece e aquilo que estamos a fazer. Quando encontrarmos esse ponto-chave a aprendizagem dispara.» O treino intensivo é um conceito estranho por duas razões. A primeira é que vai contra a nossa intuição acerca do talento**. A nossa intuição diz-nos que o treino está para o talento como a pedra de amolar está para a faca: é vital mas inútil sem uma lâmina sólida ou aquilo a que chamamos habilidade natural. O treino intensivo desvela uma possibilidade intrigante: a de que o treino pode ser mais importante que a dita habilidade natural.
A segunda razão pela qual o treino intensivo nos parece um conceito estranho é que envolve eventos que normalmente tentamos evitar – nomeadamente os erros –, transformando-os em destreza. Para percebermos como funciona o treino intensivo é necessário ter em consideração a inesperada mas crucial importância dos erros no processo de aprendizagem.
[COYLE, 2009: 28-30]



NOTAS
*Robert Allen Bjork (1939-) é Distinguished Professor of Psychology na Universidade da Califórnia (UCLA), em Los Angeles, sendo a sua área de investigação sobre aprendizagem humana, a memória e as suas implicações no treino.
**A palavra talento pode ser vaga e repleta de significados traiçoeiros acerca do potencial, sobretudo quando se refere aos jovens – as pesquisas revelam que o prodígio não é um indicador fiável para o sucesso a longo prazo. No interesse da clarificação, definiremos talento no seu sentido mais restrito: a aptidão de destrezas repetitivas que não dependem do tamanho físico (…). [COYLE, 2009: 21]

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
COYLE, Daniel. O Código do Talento. Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2009, pp. 256. ISBN 978-972-20-3790-7

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Estágio de Montanha


Rúben Jordão © Pousada da Juventude das Penhas da Saúde (Serra da Estrela, 23/11/2018)

O Centro de Formação da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal/Escola Nacional de Montanhismo (FCMP/ENM) realizou, no passado fim-de-semana (dias 23 a 25 de Novembro), um estágio sobre “Gestão de Grupos em Actividades de Montanha”. Uma oportunidade única de rever velhos amigos e de partilha de conhecimentos e de experiências entre Quadros Técnicos da FCMP/ENM, com base no estado da arte dos Cursos de Treinadores de Montanha e de Pedestrianismo – Graus I.
É fundamental que os Treinadores adoptem as metodologias e técnicas padronizadas, que são ministradas nos cursos, e que essas opções sejam alvo de reflexões críticas com vista ao seu possível e desejável melhoramento. A actualização de conhecimentos e o contínuo desenvolvimento de competências são essenciais num modelo de ensino-aprendizagem que se pretende de elevado nível e desempenho. Foi nesse contexto que as excelentes condições do terreno de jogo da Serra da Estrela – com neve, denso nevoeiro, vento, frio e pluviosidade a partir do meio da tarde de sábado – permitiram testar e desenvolver um conjunto de importantes exercícios.
Na noite de sexta-feira decorreu a apresentação teórica de um workshop sobre “Gestão e Liderança de Grupos em Actividades de Montanha com base na Paisagem”. A componente prática desse workshop realizou-se no dia seguinte, em contexto efectivo, no terreno. O programa de domingo foi alterado, com base nas previsões meteorológicas, mas ambos os workshops programados foram realizados e os objectivos concretizados: “Planeamento de Actividades de Montanha com apoio de Plataformas e Aplicações Informáticas: teoria e aplicações práticas” e “Gestão e Liderança de Grupos em Actividades de Escalada: prática”. Neste último, foram escalpelizadas manobras técnicas em quatro estações/ateliês.

DR © algures (Serra da Estrela, 24/11/2018)

DR © algures (Serra da Estrela, 24/11/2018)

António Ribeiro © algures (Serra da Estrela, 24/11/2018)

António Ribeiro © algures (Serra da Estrela, 24/11/2018)

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Tertúlia da Montanha


Na sequência da comemoração do Dia Internacional das Montanhas, estarei na Biblioteca Municipal de Lagoa, no dia 14 de Dezembro, para participar, juntamente com a Dra. Maria Luísa Francisco, numa tertúlia sob o tema “O Sentimento da Montanha: do imanente ao transcendente”.



terça-feira, 20 de novembro de 2018

Pensar (como um)a Montanha

Pensar (como um)a Montanha,
no Dia Internacional das Montanhas


O modo como os seres humanos se têm relacionado com a Natureza, em geral, e com a Montanha, em particular, não tem sido o mesmo ao longo da história. Na verdade, verificaram-se alterações profundas das concepções, paradigmas  e formas de ver e sentir o meio montanhoso. A data em que se celebra o Dia Internacional das Montanhas (11 de Dezembro) constitui uma ocasião privilegiada para abordar as éticas e estéticas da Terra que conduziram a novas formas de fazer, estar e ser (n)a Montanha, com importantes aplicações teóricas e práticas no trabalho desenvolvido pelos Treinadores na área dos Desportos/Actividades de Montanha. Tendo em conta a excepcionalidade do dia, esta Palestra da Montanha contará com uma pausa para café na qual se irá comemorar de forma especial essa importante data dedicada à Montanha.




Conteúdos programáticos:
Enquadramento
· Montanhas, Montanhismo e Desportos de Montanha
· O Dia Internacional da Montanha
· Fazer, Estar, Ser
Ética da Terra
· Alguns conceitos: antropocentrismo, sencientismo, biocentrismo e ecocentrismo
· Ética Ambiental e Montanhismo: pré-romantismo, romantismo, transcendentalismo, ética da Terra e ecologia profunda
Estética da Terra
· Leitura e interpretação da paisagem: Montanha
· Noções e abordagens da paisagem: estética, científica e técnica
· Aplicações práticas: abordagens da paisagem e necessidades de Maslow
Pensar como uma Montanha
· O Terreno de Jogo – abordagem técnica: alguns exemplos
· Análise da paisagem – utilização pedagógica: alguns exemplos
· Ser a paisagem – auto-realização: alguns exemplos
· Uma “visão” holística da Montanha