«Este Filho, por
outro lado, que passa fome, que sofre sede, que se cansa, que fica triste, que
está ansioso, que é importunado e mortificado, que tem de tolerar apoiantes que
não o entendem e opositores que não o respeitam – que espécie de deus é ele? É
um deus a uma escalada demasiado humana, é o que ele é. Há milagres, sim,
principalmente de natureza médica, uns poucos para satisfazer os estômagos
humanos esfomeados; no máximo acalma uma tempestade, caminha um pouco sobre a
água. Se isto é magia, é uma magia menor, ao nível dos truques de cartas.
Qualquer hindu é capaz de fazer cem vezes melhor. Este Filho é um deus que
passava a maior parte do tempo a contar histórias, a conversar. Este Filho é um
deus que caminhava, um deus pedestre – e num lugar quente, ainda por cima –,
com um andar como o andar de qualquer humano, com as sandálias por cima das
pedras ao longo do caminho; e, quando usava um meio de transporte, era um burro
vulgar. Este Filho é um deus que morreu em três horas, com queixumes, arquejos
e lamentos. Que espécie de deus é este? O que há de inspirador neste Filho?
O amor, disse o
padre Martin.» [MARTEL, 2012: 70]
Pedro Cuiça © Catedral de Sevilha (2017)
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA
MARTEL, Yann. A
Vida de Pi. Barcarena: Editorial Presença, 2012, 11ª ed., pp. 322.
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