domingo, 21 de março de 2021

É o Tempo



«Vivemos, sem dúvida, um tempo de transição e de excepção, sente-se dans l’aire du temps. É, sem dúvida, chegada a hora;(…). É a hora de empreender a pacifista “guerra santa” do espírito, do espírito do(s) lugar(es), do Grande Espírito, do Espírito Santo. É o tempo de evocações à Terra, de canções e danças de poder, de lançar a voz do tambor como oferenda ao Espírito do Mundo. De ser poeta, de acção directa, como os diné, dizendo os nomes da terra, «porque esses nomes são bons de dizer» e, dessa forma, cavalgar no espírito, pela paz e pelo bem de todos, humanos e não humanos, pela Mãe-Terra. É o tempo de meditar e de orar por Gaia: a Terra viva e vivificante.

(…) A tradição simbólica de Joaquim de Flora, e também de Jakob Böehme, vê no lírio a promessa da vinda do Lilienzeito Tempo dos Lírios, paraclético, que sucederá ao tempo crístico das rosas e ao tempo da “ira” paterna dos «espinhos e ervas daninhas». O tempo dos lírios já chegou! Na verdade, sempre aqui esteve porque o Espírito Santo nunca nos abandonou. Nós é que temos de ir ao seu encontro. Tal como o singelo Myosotis, não o devemos esquecer.» [CUIÇA, 2020]


E porque hoje é Dia da Árvore, Dia Mundial da Floresta e Dia Mundial da Poesia (e mesmo que não fosse): todos os dias serão auspiciosos para celebrar a Natureza fecunda e a vida, ademais nos alvores primaveris de mais uma Roda do Ano… Viva a vida.




VISITA À FLORESTA

 

Que frescura meu Deus, e que deslumbramento!

Sancho Pança, vai pôr a albarda ao teu jumento,

E conduze-o depressa aqui para eu o montar.

Embebeda-me o azul, o Céu, a Terra e o Mar!

Descalcem-me o coturno heróico da epopeia.

Não sei que cotovia olímpica gorjeia

Dentro de mim; não sei que hilaridade é esta!

Satura-me o vigor profundo da floresta,

E debaixo do azul puríssimo, sem nuvens,

Sinto-me transbordar, como um titã de Rubens,

Numa explosão de força atlética, purpúrea!

Entra-me nos pulmões a latejar com fúria

Este excesso de vida imensa que atordoa!...

(…)

Dai-me um tirso virente e uma merenda boa.

Que me quero perder nas solidões da mata.

Leva-me tu, Virgílio, o burro pela arreata.

(…)

Ó clareiras do bosque! Ó penumbras sagradas!...

Como o Sol entra aqui a rir às gargalhadas, e como a Natureza é virginal e é pura!

A alma se me esvai, fundida de ternura,

Em murmúrios d’amor, em êxtase de crente!...

Como isso moraliza e diviniza a gente!

Dá-me vontade de ir subindo essas encostas,

Ajoelhando, a beijar a terra de mãos postas!

Eu quisera enroscar-me aos robles como a hera,

Ser perfume no lírio e ser vigor na fera,

Desfazer-me, diluir-me em luz, em ar, em cores,

Semearem-me e nascer todo o meu corpo em flores,

Como as águias voar no oceano do infinito,

Ser tronco, ser réptil, ser musgo, ser granito,

De forma que eu andasse, em átomos disperso,

No Céu, no mar, na luz, na terra no – universo!

(…)

Entre este fecundar de seivas luxuriantes,

Entre a vida brutal das árvores gigantes

Levantando ao azul os pulsos seculares,

Entre as vegetações frescas de nenúfares,

De cactos, de jasmins, de silvas, de roseiras,

De serpentes em flor – isto é, de trepadeiras,

A crescer, a romper da terra funda, escura,

Debaixo desta rica igreja de verdura,

Trespassada da luz cruel do Sol faminto,

Ó Natureza, ó Terra, ó minha mãe! Eu sinto,

Sinto bem que nasci do teu enorme flanco,

E que o homem e o tigre e o cedro e o lírio branco

São filhos a quem dás de mamar no teu seio

Eternamente bom e eternamente cheio!

Guerra Junqueiro

in Poesia da Árvore – antologia poética (1979: 31)

 

 

PC Ó Equinócio da Primavera (Oeiras, 20/3/2021)

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CUIÇA, Pedro. Espírito Santo: O Tempo dos Lírios. Lisboa: Irmânia – videoconferência O Espírito e a Terra, 31/Mai. 2020; inéd., disponível em Academia.edu.

RODRIGUES, Resina. Poesia da Árvore – antologia poética; 1979, pp. 100.




sábado, 20 de março de 2021

Primeiro VERão

 

©DR

Hoje celebra-se o Equinócio da PrimaVERa, às 9:37 a.m., com a entrada do Sol em Carneiro: o instante em que o Astro Rei cruza o plano do Equador terrestre, que é projectado na Abóbada Celeste… A palavra 'equinócio' vem do latim ‘aequus’ (igual) e ‘nox’ (noite), aplicando-se aos dois dias do ano – na PrimaVERa e no Outono – nos quais a duração diurna e nocturna são idênticas.

O planeta Terra para além do movimento de rotação apresenta também um movimento de translação, responsável pelas estações do ano e pela trajectória aparente do Sol na Abóbada Celeste variar ao longo do ano, fenómeno observável facilmente através da variação do posicionamento do nascer-do-sol e traduzido na imagem abaixo.

 

Ó Zaid M. Al-Abbadi

A imagem regista a posição do nascer do Sol ao longo dos meses de 2019, a partir das cercanias da cidade de Amã (Jordânia). A câmara fotográfica está sempre apontada na mesma direcção: o Leste geográfico. O Norte fica, portanto, à esquerda do observador e o Sul à direita. Embora se considere que o Sol nasce a Leste isso só acontece verdadeiramente em dois dias do ano: nos Equinócios da PrimaVERa e do Outono. No Hemisfério Norte, no Solstício de Inverno o Sol nasce na posição mais a sul do Leste e no Solstício de Verão atinge a posição mais a norte do Leste. O Sol desloca-se, portanto, ao longo de todo o ano, parando apenas durante três dias nas posições extremas solsticiais. Razão pela qual os povos antigos consideravam que o Sol morria no Solstício de Dezembro e ressuscitava ao terceiro dia...

No contexto da deambulação anual do Sol fácil será, portanto, assinalar o posicionamento equinocial correspondente ao Este: o Oriente, que é também um dos nomes de Deus. Desta feita comemora-se o Equinócio VERnal: a palavra “primaVERa” resulta da junção das palavras latinas ‘prima’ (primeiro) e ‘vere’ (verão). Na época romana, e até ao século XVI, a época do ano que denominamos ‘primavera’ chamava-se 'Verão' e o actual Verão era denominado "estio" (do latim ‘aestas’)." A entrada do Sol no signo Carneiro, regido por Marte e pelo elemento fogo, que é o primeiro signo do Zodíaco, está associado ao ímpeto iniciador: o (re)florescer da Terra Viva. O novo ano em muitas tradições como o NawRuz persa... Uma ocasião excepcional para homenagear e celebrar essa primeira VERdade que é a Natureza vivificadora e vivificante, designadamente através de caminhadas reintegradoras dos ritmos inerentes à Roda do Ano.





terça-feira, 16 de março de 2021

Ética e Deontologia

 


Na sequência do processo de desconfinamento no âmbito da pandemia de Covid-19 e da consequente retoma gradual da actividade formativa por parte do Centro de Formação da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal (FCMP), no próximo dia 9 de Abril irá decorrer uma palestra sobre o tema Ética e Deontologia em Desportos de Montanha. Esta acção de formação online visa abordar a importância da ética na condução de actividades e no treino em Desportos de Montanha, designadamente nas vertentes desportiva, ambiental e turística. Nesse contexto, será efectuado um breve enquadramento da temática em causa, tal como da história e diversos conceitos no âmbito da ética normativa, ética ambiental e ética do desporto, para depois passar a alguns exemplos de aplicação da ética em situações concretas de tomada de decisões, nomeadamente em situações de dilemas éticos. Esta palestra vem na sequência das aulas ministradas por nós, de 2014 a 2017, no âmbito da Unidade Curricular de Ética e Deontologia Profissional, do sexto semestre da licenciatura de Treino Desportivo, da Escola Superior de Desporto de Rio Maior, tal como da aula ministrada a alunos de mestrado, em 2018, na Escola Superior de Desporto e Lazer (Melgaço), na palestra realizada, em 2019, na Universidade da Beira Interior (Covilhã) ou do webinar, concretizado em 2020, na Escola Técnica Superior Profissional do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, entre outras iniciativas similares.

Este evento, que se insere no Programa Nacional de Ética no Desporto (PNED), trata-se de uma Acção de Formação Contínua certificada pelo Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) com vista à obtenção de Unidades de Crédito (UC) para a revalidação dos Títulos Profissionais de Treinador de Desporto (TPTD) das modalidades de Alpinismo, Montanhismo, Escalada, Pedestrianismo e Canyoning, nos seus diversos graus e qualidades.

Para mais informações consulte o site da FCMP.




segunda-feira, 15 de março de 2021

Este Homem é um Senhor

 


Um online stream, de mais de três horas, SOBRE A VIDA de Reinhold Messner, na primeira pessoa, e, como não poderia deixar de ser, sobre a Montanha e a Natureza Selvagem (Wilderness), sob diversos pontos de vista e conceitos, designadamente acerca do que é aventura, liberdade e responsabilidade. Uma oportunidade única de conhecer esse lendário alpinista, a própria história do alpinismo, diversas abordagens da Montanha e muito mais... Ficam aqui três pequenas citações daquele que foi, indubitavelmente, um evento excepcional.


Over the years, I have learnt that on the one hand, there is human nature, deep inside us, almost like an inborn human directive that has been passed on genetically over thousands of years, from one generation to the next. And on the other hand, there is natural law, out in the wild, and we are subjected to both these laws. When two elements, Mother Nature and Human Nature come together, great things can happen. William Blake, a romantic English poet once said: “Great things are done when men and mountains meet”. At the most, we leave a track in the snow. No, the great thing happen inside of us.

 

According to local village lore, the village pastor took my great-grandfather aside to tell him that his beahaviour was unacceptable and that he need to send his sons to school and to church on Sundays. Apparently the old farmer replied: “My church” – and by that he meant the Geisler pinnacles, that tower over St. Magdalena – “is far mightier than your measly little church tower in the valley.He was an anarchist at hearth, and I seem to have picked up some of his DNA.

 

But what fascinated me even more, was the freedom I experienced while climbing those rock walls. (…) Complete freedom and total responsability. (…) I prefer not to speak of moral values on the mountains. We carry complete responsability in the mountains. Human Nature tell us what we can do and how we can do it. If you regard ethics to be instinctive and genetically determined, then yes, I follow some kind of ethical code. But by and large, it is importante to realize that we are making an independente decision to take on a tour of this kind and we therefore carry complete responsability for it.


quinta-feira, 4 de março de 2021

Em defesa dos caminhos

 

Concelho de Oeiras Ó PC (3/3/2021)

Numa época marcada pela antropomorfização da paisagem, na qual proliferam intervenções profundamente impactantes e danosas para o património viário, designadamente através da implementação de passadiços e nefandas "requalificações", é fundamental dar primazia à natureza e apelar à protecção dos caminhos de pé posto...


Concelho de Oeiras Ó PC (3/3/2021)