sábado, 13 de agosto de 2022

Estilo Precipício

 



O «estilo precipício» nas edificações dos carmelitas descalços consistia na recreação e preservação da inacessibilidade e do desconforto, e, muitas vezes, coincidia com a natureza e simbologia da montanha como lugar de iniciação e de epifania místicas. Traduzia-se pela exaltação do obstáculo e da capacidade de o superar. Conseguir encontrar-se todos os dias com a morte e dar-lhe um aperto de mão, oferecer-lhe uma cadeira para ela descansar, pedindo-lhe, porém, que se atrasasse um pouco do seu intento não para fugir à morte, mas para sofrer um pouco mais, e tudo isto sem perder a bondade perante os que sofrem, ainda que sofressem apenas por não conseguirem criar uma «flor inverosímil», como o monge do Buçaco que durante sessenta anos tentou criar uma rosa azul.

Susana Neves (2022, p. 64)

 

Um grupo de monges carmelitas descalços portugueses fundou, em 1628, um deserto ou eremitério, no extremo noroeste da serra do Buçaco, inspirados pelo exemplo de Santa Teresa de Ávila e San Juan de la Cruz: reformadores da Ordem de Nossa Senhora do Monte Carmelo.

O deserto do Buçaco, enquanto «local de recolhimento, oração e ascese», favorável à vivência do silêncio, coexistiu com a presença do sagrado, expressa de forma inequívoca no frondoso bosque resultante dos trabalhos de arborização levados a cabo por frades e monges. A autora, Susana Neves, calcorreou a mata inúmeras vezes «no modo e no tempo de um carmelita descalço, ou seja, a pé (embora descarmeliticamente tenha andado sempre bem calçada) e sem ninguém por perto» (NEVES 2022, p. 12). O «estilo precipício» foi traduzido não só nas edificações dos carmelitas como também, e sobretudo, na construção do templo interior de cada um dos monges.  Um livro a não perder.


Título: Ama o Precipício – Viagem à Mata Nacional do Buçaco

Autora: Susana Neves

Edição: Fundação Francisco Manuel dos Santos (Maio 2022)

ISBN: 978-989-9064-59-1 




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