sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Walk Art

A paisagem surge como o tecido cósmico onde decorrem as nossas demandas, não só a pé(s) como de corpo inteiro e alma, enquanto natural expressão da nossa arte.  

© Algures da Net

O antropólogo e arqueólogo francês André Leroi-Gourhan (1911-1986) defendeu que o desenvolvimento e o progresso da humanidade surgiram não tanto do cérebro mas dos pés. Em suma, identificou o início da humanidade com o momento a partir do qual esta adquiriu uma posição bípede persistente. Do acto de estar em pé ao andar parece “de-correr” um pequeno passo mas tal não é assim tão simples. Por outro lado, do acto de andar, erguido sobre dois pés, à arte parietal paleolítica, expressa de forma sublime em diversas grutas, vai uma passada de gigante.
Uma característica notória do género Homo é, indubitavelmente, a sua capacidade técnica e, mais ainda, artística. A produção de utensílios, não sendo seu exclusivo, toma proporções invulgares e remete para as mãos, de polegar oponível, e para numerosas questões sobre o natural e o artificial, que continuam a suscitar polémica e que estão longe de consensos.

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Ainda na sequência do post anterior, sobre o intervencionismo excessivo e desadequado no terreno/paisagem, reiteramos a importância da criatividade humana, designadamente em acções de land art, entre outras formas de expressão. Com um especial enfoque, desta feita, no “singelo” acto de andar a pé enquanto forma de arte per se e que, por isso, exige uma atenção e um reconhecimento mais amplo do que aquele que lhe é vulgarmente dado. Nesse contexto, será de realçar tanto a importância dos pés quanto a do piso e a do pisoteio. Mais, os pés não progridem sozinhos nem o trajecto se cinge ao caminho de pé-posto. A marcha processa-se de corpo (inteiro) e alma, num território que não é apenas envolvente porque o artista caminheiro é parte integrante do todo. O caminheiro faz parte da paisagem e, neste contexto, não se trata tão somente de uma expressão de walk art mas também de land art. Arte efémera, é certo, mas não menos poderosa por isso: é eterna enquanto dura!…

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Não será, pois, de estranhar que a actuação do “pedestrianismo”, no domínio da criatividade e da intervenção cívicas, se tenha tornado, particularmente desde a década de 1960, uma importante ferramenta de expressão artística contemporânea. A caminhada, nesse âmbito, surge como uma actividade multifacetada que ultrapassa, em muito, a simples motricidade, da marcha bípede, para se tornar uma liberdade de expressão, não só física como mental, mormente com uma marcada componente crítica e interventiva em domínios como a ética e a estética ambientais, a ecologia profunda e a ecosofia ou até a metafísica e o sagrado. O andar surge como acto criativo e experimental, sob múltiplas roupagens e possibilidades, em solitário ou em grupo, de forma concreta e/ou metafórica.

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